Quando o sonho de trabalhar na sua área e na Austrália vira um pesadelo

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“Só podíamos encher a garrafa de água uma vez por dia," lembra "Fernanda"

“Só podíamos encher a garrafa de água uma vez por dia, e ir ao banheiro uma vez pela manhã e uma vez à tarde. Porque o patrão vigiava a gente usando câmeras de segurança e contava quantas vezes saíamos do local de trabalho”. Conheça Fernanda* e como as condiçoes de trabalho afetaram sua saúde física e mental.


*nome da entrevistada foi trocado por questões de privacidade.

“Fernanda”, estudante brasileira em Melbourne, chegou à Austrália em 2022, como muitos tinha o sonho de aprimorar o inglês e encontrar novas oportunidades de crescimento profissional.

Formada em design de moda, Fernanda conseguiu uma oportunidade em um ateliê de vestidos de noiva, exatamente em sua área de interesse como costureiras e bordadeira.

Mas a alegria em trabalhar na área e na Austrália se tornou um pesadelo.

Um dia de trabalho típico envolvia horário fixo para poder ir beber água ou ao banheiro, obrigatoriedade de trabalhar na mesma posição - em pé ou sentada - em um banco de aço, e ser cobrada toda vez que tentava se alongar e encher a garrafa de água.

“Só podíamos encher a garrafa de água uma vez por dia, e só podíamos ir ao banheiro uma vez pela manhã e uma vez à tarde. Porque o patrão vigiava a gente usando câmeras de segurança e contava quantas vezes saíamos do local de trabalho”, lembra Fernanda, que mesmo doente, foi solicitada a não deixar o seu posto para não atrasar a entrega da produção dos vestidos.
Close-up on female hands sewing wedding dress details
Fernanda chegou a trabalhar quase 22 horas diretas e não recebeu nenhum pagamento de hora extra, noturnas ou final de semana. Credit: NicolasMcComber/Getty Images
Fernanda conta que recevia ameaças de suspensão de trabalhos.

Ela também percebeu que não recebi pagamento diferenciado para horas extras, noturnas e finais de semana.

“Uma vez ele me pediu para ajudar a terminar um vestido no turno de sábado, que inicialmente terminaria às 16h, mas terminamos às 7h do dia seguinte. Não, ele não pagou nenhum diferencial de hora extra, apenas o valor normal da semana”, lembra Fernanda.

Como se proteger da exploração no trabalho?

Morar fora do seu país parece um sonho para muitos. Recursos são arrecadados, planos são feitos e muito se deixa para trás para viver uma experiência ou um objetivo maior. Mas uma das maiores armadilhas que podem transformar esse sonho em pesadelo é a falta de informação sobre os direitos trabalhistas na região.

A população migrante e de baixa renda é a mais vulnerável e susceptível de ser explorada no local de trabalho, e a Austrália não está fora dessa lista. De acordo com o Australian Fair Work os migrantes representam 7% da força de trabalho australiana, mas estão sob-representados no trabalho de conformidade e fiscalização do Fair Work Ombudsman, que aponta17% de todas as denúncias formais vinda de imigrantes, além de 20% dos relatórios anônimos recebidos e 15% de todos os litígios iniciados apenas entre 2022-23.
Immigrants walking for hope in better future
A população migrante e de baixa renda é a mais vulnerável e susceptível de ser explorada no local de trabalho Source: Moment RF / Jasmin Merdan/Getty Images
O advogado brasileiro Dr. Valmor Gomes Morais, que atua como mediador de casos, líder da comunidade brasileira que também atuou como Cônsul Honorário do Brasil em Queensland, explica que saber o nome de sua função e entrar em contato com os conselhos sindicais e locais é o primeiro passo para obter informações e apoio em caso de abuso no trabalho.

“Recomendo os sindicatos, que são as unions, e os locais de apoio jurídico gratuito, que são os Community Legal Centers. Se você confirmar que está sendo explorado, procurar o Australian Fair Work, e em caso de lesão física ou psicológica no trabalho, entre em contato com os work legal advisers”,, explica Valmor.

Valmor destaca ainda que a busca pelos seus direitos trabalhistas não afeta a situação do seu visto, pois este é um dos principais receios dos migrantes na busca de apoio.
A male engineer holds a telephone at a construction site
Saber o nome de sua função e entrar em contato com os conselhos sindicais e locais é o primeiro passo para obter informações e apoio em caso de abuso no trabalho. Source: Moment RF / Longhua Liao/Getty Images
“Na verdade, é uma grande ilusão não realizar os seus direitos, mas na Austrália, os imigrantes têm os mesmos direitos que os locais. Se você vir um australiano ganhando mais do que você na mesma função, você tem o direito de fazer valer os seus direitos. Mas, infelizmente, muitas empresas têm a prática de explorar os imigrantes, e isso já acontece há muitos anos e com as mulheres.”

Links informativos:

- Relatório do Grupo de Trabalho dos Trabalhadores Migrantes - https://www.dewr.gov.au/migrant-workers-taskforce/resources/report-migrant-workers-taskforce

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