Juliana Neves inaugura nova era para o circo na Austrália: diretora de Estudos Circenses do NICA

Juliana Neves

“Equilibrar corpo, emoção e imaginação”: é assim que Juliana Neves define o circo, arte que agora ensina e transforma na Austrália. Foto: Carlos Gueller.

A artista e educadora Juliana Neves é a primeira brasileira a liderar o curso de Bacharelado em Artes Circenses do NICA, Instituto Nacional de Artes Circenses, o principal centro de formação da Austrália.


Com uma carreira internacional que ultrapassa três décadas, Juliana Neves é acrobata aérea, coreógrafa e educadora.
Juliana Neves
“Equilibrar corpo, emoção e imaginação”: é assim que Juliana Neves define o circo — arte que agora ensina e transforma na Austrália.
Em 1998, ela fez história ao se tornar a primeira artista de São Paulo a integrar o famoso Cirque du Soleil, onde se apresentou como solista no espetáculo Dralion e representou a companhia canadense em turnês pelo mundo.

Agora, em 2025, Juliana volta a fazer história como a primeira brasileira a liderar o curso de Bacharelado em Artes Circenses do NICA (National Institute of Circus Arts/ Instituto Nacional de Artes Circenses).

À frente da instituição, ela quer fortalecer a conexão entre arte, educação e inovação — e promete trazer mais música para a prática circense na Austrália.
Juliana Neves
Com uma carreira sólida no Brasil e nos Estados Unidos, Juliana é a mais nova aquisição do NICA.
"Eu sou a diretora do bacharelado de circo do NICA e também do programa vocacional. O NICA, na verdade, é um instituto muito conceituado, é o único bacharelado em Artes Circenses do hemisfério sul. Não existe nenhuma outra escola que dê diploma universitário para as Artes Circenses.

"Para mim, é um passo fantástico na minha carreira, porque em 2020 eu estava nos Estados Unidos trabalhando numa escola que eu acho que é uma das melhores escolas dos Estados Unidos, chamada circo Juventas, no estado de Minnesota. Eu estava prestes a lançar o primeiro bacharelado de circo dos Estados Unidos. Lá também não existe um curso de nível universitário de artes circenses, mas a pandemia colocou o projeto por água abaixo e não mais aconteceu. Então quando surgiu essa oportunidade para vir para cá, eu achei que fazia sentido na minha carreira, apesar de significar uma mudança de continente, de país, de novo, mas aqui estou," diz.
Juliana Neves
Juliana está voando alto também na Austrália.
Circo no Brasil e na Austrália

Juliana acredita que o Brasil pode aprender com a Austrália no quesito formação de professores.

"Eu acho que o circo no Brasil precisa abrir cursos de bacharelado e assim atrair mais mestres circenses. O circo da Austrália com certeza pode aprender um pouco com a maleabilidade, com a criatividade do brasileiro e com a música."

O que o Brasil pode trazer para a Austrália?

"O que eu senti até agora aqui é que o Instituto tem que olhar para a música, eu acho que falta. Acho que a música está em todas as artes. Tem uma influência muito grande em todas as artes no Brasil. Eu acho que o brasileiro tem a música dentro dele. Eu quero muito trazer isso para essa escola, que é essa abertura com as outras artes," diz Juliana.
O Brasil tem uma força muito grande, os espetáculos que eu vi no Brasil são de uma garra, uma coisa que está no Global South, está nos países do sul, nos países mais pobres.
Juliana Neves

Um Circo Que Amplia Fronteiras

O NICA sedia nesta semana a Conferência Australiana de Circo, com o tema Out of Lines. O encontro acontece no centro de treinamento da NICA, em Melbourne, entre 8 e 10 de outubro, e propõe fortalecer os laços entre artistas, pesquisadores e educadores — reafirmando o papel do circo como uma arte viva, diversa e em constante reinvenção.
Juliana Neves
Com mais de 30 anos de carreira internacional, Juliana Neves combina técnica, criatividade e inovação no comando da NICA.
Entre os participantes estão Dr. Joe Culpepper, mágico, educador e pesquisador do Research Centre for Human Potential (Montreal); Patrice Aubertin, fundador e diretor do mesmo centro; e Dr. Véronique Richard, especialista em psicologia do desempenho e criatividade da University of Queensland

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Simona Jobbagy, CEO do NICA, e a nova contratada, diretora do curso de bacharelado Juliana Neves.
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Luciana

A Juliana Neves, que vive em Melbourne, é bailarina, acrobata aérea e a primeira artista de São Paulo a integrar o famoso Cirque du Soleil, uma companhia circense do Canadá que se apresenta pelo mundo. Ela também fez história ao se

tornar a primeira brasileira a assumir a direção dos estudos circenses brasileiros. do NICA, o Instituto Nacional de Artes Circenses da Austrália. A Juliana chega num momento muito especial. O Instituto vai sediar a Conferência Australiana do Circo, de 8 a 10 de outubro, aqui em Melbourne. Evento

importante que reunirá artistas de várias partes do mundo e que discutirá o futuro do circo. Eu sou Luciana Fraguas e converso agora com a Juliana Neves sobre o futuro da arte circense na Austrália e, por que não, no mundo. Oi Juliana, tudo bem? Seja bem-vinda à SBS em Português.

Juliana Neves

Olá, muito obrigada por me receber aqui.

Luciana

Você acaba de assumir o cargo de diretora dos estudos circenses do NICA. Explica pra gente qual é exatamente a sua função e o que mais te empolga nesse novo desafio.

Juliana Neves

Olha, é prazer enorme ter recebido esse convite. Eu sou a diretora do bacharelado de circo que existe aqui na NICA e também do programa vocacional que é certificado 4. É diploma independente. O Nica, na verdade, é uma escola muito conceituada, oferece o único bacharelado em Artes e Ciências do

Hemisfério Sul. Não existe nenhuma outra escola que dê diploma universitário para as Artes Circenses. Para mim, é um passo fantástico na minha carreira, porque em 2020 eu estava nos Estados Unidos trabalhando numa escola que eu acho que é uma das melhores escolas dos Estados Unidos, chama Circus

Juventus, no estado de Minnesota. E eu estava prestes a lançar o primeiro bacharelado de circo dos Estados Unidos. Lá também não existe curso de nível universitário de artes e ciências, mas a pandemia colocou o projeto por água abaixo e nunca mais aconteceu. Acabei indo para o Brasil, depois para

São Francisco, dirigi minha escola lá e nunca cheguei a trabalhar num bacharelado de artes e ciências. Então quando surgiu essa oportunidade para mim de vir para cá, Eu achei que fazia sentido na minha carreira, apesar de significar uma mudança de continente de país de novo, mas aqui estou.

Luciana

No seu material de imprensa, você fala sobre incentivar a excelência técnica, a criatividade e o desenvolvimento profissional dos novos artistas. Como é que isso se traduz de maneira prática no dia a dia dos alunos?

Juliana Neves

Ótima pergunta, porque é isso que eu tenho desde que eu cheguei aqui há duas semanas. o que eu estou observando e pensando como traduzir em palavras para que as pessoas entendam o que eu estou pretendendo fazer. Eu acho que pelo que eu tenho lido de todo o currículo, o currículo dessa escola,

priorizar o tempo no solo, o tempo de prática circense e reorganizar todo o currículo e olhar para o currículo global e ver como a gente pode priorizar o treinamento. desenvolvimento profissional para os professores trazerem, outros professores trazerem. Fazer muitos workshops com professores

internacionais para melhorar o nível dos nossos professores. Isso é uma coisa que eu tenho que fazer. Eu acho que dos motivos que eles escolheram para esse cargo é porque eu tenho uma rede mundial de contatos, né? Então, acho que a gente vai conseguir abrir pouco a Austrália para o mundo e com

conexões com outras escolas, intercâmbios com as escolas. E é, eu acho que priorizar a técnica circense. A escola tem priorizado bastante o movimento, a performance, e parece que os alunos querem ficar mais tempo de palco e circo mesmo. Então, acho que isso é o que eu tô sentindo, que vai

precisar ser feito, e eu já tenho observado isso, que é possível aumentar o nível técnico dos alunos.

Luciana

Você fez aplicação para esse trabalho. Você deve ter competido com outros profissionais do circo do mundo inteiro para ser escolhida diretora dos estudos circenses de uma das maiores instituições de circo aqui na Austrália e reconhecida mundialmente. Deve ter sido processo bem competitivo. Como é

que foi?

Juliana Neves

Eu estava nos Estados Unidos dirigindo o Circus Center, que é uma escola que existe há muitos anos também em São Francisco. Eu estava encontrando dificuldades, aí eu comecei a resolver que eu queria sair da escola, não queria mais ficar lá e comecei a procurar. E aí eu vi no website do NICA que

eles estavam procurando diretor de Circus Studies, diretor por bacharelado, e dizia na aplicação que você tinha que ter visão de trabalho para Austrália. E quando eu apliquei eu disse, olha, eu não tenho permissão de trabalho para a Austrália, eu nunca nem fui na Austrália. Viajei muito mundo, mas

as minhas turnês não me levaram para a Austrália. Mas eu acho que esse é trabalho para mim. E aí tiveram entrevistas. Eu não tenho certeza, não sei quantas pessoas que foram entrevistadas, mas foi uma entrevista online com painel de 7 ou 8 pessoas e eu acho que eu impressionei porque foi só uma

entrevista mesmo.

Luciana

Só uma entrevista com 7 ou 8 pessoas e em inglês?

Juliana Neves

É, foi em inglês, eles disseram a gente vai entrevistar outras pessoas e até o final da semana a gente... entra em contato com você e eles me ligaram dois dias depois dizendo que não que era me oferecendo o trabalho e fizeram toda todo o processo de imigração e pagaram tudo tudo tudo que precisou.

Demorou. Foi um pouco árduo o processo demorou. O governo australiano faz uma pesquisa muito muito muito completa eu acho para Dá visto, demorou seis meses para sair, mas saiu e aqui estou.

Luciana

E você está com visto de residência permanente? Qual visto?

Juliana Neves

Não, são quatro anos. Aparentemente chama Skilled Visa, é o mesmo visto de habilidade extraordinária que existe nos EUA. O empregador prova que não existe alguém no país com as capacidades para exercer essa função. Então tem que buscar internacionalmente. Eu acho que é esse tipo de vício. Mas o contrato é

tempo determinado. Então se tudo continuar bem, acho que é só pedir para estender o vício ou pedir outro vício depois.

Luciana

E falando, do NICA, rapidamente assim, quantos alunos tem, quantos professores, qual que é o tamanho da instituição?

Juliana Neves

Olha, é uma escola relativamente grande. O programa de bacharelado, por ser programa muito específico, na verdade é para praticamente, é professor para cada aluno. Então, a gente recebe mais ou menos máximo de 25 alunos por ano. Então, a gente acabou de fazer a audição semana passada, essa semana a

gente tá vendo as audições que foram mandadas por vídeo, as pessoas que não puderam vir pessoalmente e a gente tem mais ou menos uns 85 candidatos pra 25 vagas no bacharelado, talvez 25 vagas pro vocacional, pro certificado 4. Mas o NICA também tem programa recreativo, né, programa que de aberto a

todo mundo de todas as idades. Temos alunos de cinco de quatro até setenta e dois parece temos uma aluna de setenta e dois anos que faz que faz artes aéreas aqui. Olha pelas noites e aos sábados. E eu acho que esse programa tem mais ou menos umas 400 pessoas no total. Então a gente serve também

escolas locais que vem a gente tem parceria com escolas que vem e passam o dia aqui. Por exemplo, agora na minha frente aqui está uma escola. A gente tem programas de verão, de férias escolares. Como são férias escolares essas duas semanas, tem cada dia grupos de 30, 40 crianças que passam o dia

aqui. E, na verdade, é a única instituição de bacharelado da Austrália. Não tem outra. Não temos competição, na verdade. Somos o que todas as 12 escolas de circo que tem na Austrália, o caminho para essas crianças quando chegam no ano 12, quando se formam no secundário, se eles quiserem continuar,

na ECA é opção para elas.

Luciana

É particular, privado, eles têm que pagar ou é subsidiado pelo governo?

Juliana Neves

A gente tem apoio do governo federal, do governo estadual, mas a gente também gera orçamento e não depende somente do governo federal. Mas tem programas de bolsas para pessoas que não podem pagar, mas é uma universidade privada.

Luciana

Você chega num momento onde o NICA vai sediar uma conferência em âmbito nacional, trazendo artistas circenses de várias partes do mundo, e traz o tema Out of Lines, ou Fora das Linhas. O que esse conceito de Fora das Linhas significa, Juliana?

Juliana Neves

Na verdade, se eu tivesse que traduzir em português, seria Fora da Lonja. Lonja é sistema, é quando o circense está aprendendo a fazer uma nova habilidade, ele usa cinto de segurança, é cinto com uma corda e o professor segura essa lonja, que em inglês é 'lines'. E quando você pode fazer o seu

truque sozinho, quando você completou a excelência do seu truque, você 'go out of lines', você tira a lonja e você pode fazer o truque sozinho. sem ajuda do professor. Então eu acho que o nome veio dessa metáfora com a excelência do circo, de você conseguir estar out of line. E também aí pode ser fora

da linha também, abrir o pensamento pra fora do padrão.

Luciana

Fora da caixa, né?

Juliana Neves

Fora da caixa, exatamente, fora da caixa. Achei bem criativo o nome.

Luciana

Só deixando claro, então, esse Fora da Lonja é para truques acrobáticos aéreos, que eles estão lá em cima, é isso ou não?

Juliana Neves

Pra tudo, na verdade, depende da escola. Por exemplo, na China. Na China, eles usam a lonja pra fazer acrobacias no solo. Eles usam pra tudo. Eles usam pra barra russa. Na verdade, é utilizado em quase todas as habilidades de ciências. E mesmo, por exemplo, no número de monociclo, tem uma pessoa

em cima da outra, existe sistema que a lonja faz círculo junto com os dois acrobatas pra o acrobata que tá em cima da cabeça do outro, por exemplo, treinar com o cinto para quando ele cair ele não se machucar, até ele aprender a fazer o truque.

Luciana

Quando você finalmente retira a lonja, você está preparado para o perigo, você já superou grande obstáculo.

Juliana Neves

E preparado para o palco, preparado para apresentar isso para o público, ou para a competição, se for para festival. Uma grande conquista, exatamente, quando você conseguiu sair e tirar o truque da lonja. No Brasil a gente fala muito, nossa, tirei o truque da lonja, sabe? É uma expressão muito

conhecida.

Luciana

Nessa questão da arte circense global, como é que você vê o circo da Austrália e o circo do Brasil? Eles têm características diferentes e como é que país pode aprender com o outro? O que o circo australiano pode aprender com o circo brasileiro e vice-versa?

Juliana Neves

Ótima pergunta. O que é interessante para mim é que em São Paulo, eu sou de São Paulo, a primeira escola de circo que teve em São Paulo foi a Escola Picadeiro, que era ali na cidade de Ardim. O que aconteceu foi que, em 1994, Circus Oz foi para São Paulo e foi uma revolução. Teve, assim, o antes do

Circus Oz e depois do Circus Oz, sabe? Eles deram uma chacoalhada, mas ficou todo mundo muito impressionado com essa maneira de fazer circo, que era uma coisa com humor fantástico, uma criatividade nos números que ficou todo mundo boquiaberto, na verdade. E eles estiveram com a gente na escola, deram

workshop pra gente. Eu fui uma das fundadoras da companhia CN Canal Dicas, em São Paulo, que existe até hoje. E a gente tinha espetáculo e eles foram assistir. E aí, outro dia, aqui mesmo, numa reunião online, onde eu conheci o Mr. Lu, eu acabei descobrindo que ele estava nesse espetáculo e foi ele

que deu o workshop pra gente. E ele que me ensinou a fazer o Mortal Pra Frente na báscula, que virou o meu truque nos próximos dois anos lá no Brasil. uma vanguarda, uma coisa muito diferente do resto do mundo. Era humor muito específico, era uma coisa muito... Até hoje eu tenho memória dos melhores

números de títulos que eu vi, fora os chineses, claro, porque pra mim a China é capítulo à parte. Eu acho que tem a China e depois tem o resto do mundo, sabe? A China começou e fez tudo, começou lá, né? Tirando a China, eu acho que a Austrália Os meus números de circo favoritos, na verdade. E eu

acho que o circo no Brasil precisa abrir bacharelado e precisa atrair mestres mesmo. Mestres que faltam. Falta formar professores, né? O circo da Austrália com certeza pode aprender pouco com a maleabilidade, com a criatividade do brasileiro e com a música. O que eu senti até agora aqui é que essa

escola tem que olhar para a música, eu acho que falta, acho que a música tá em todas as... tem uma influência muito grande em todas as artes no Brasil. Eu acho que o brasileiro tem a música dentro dele, sabe? Eu quero muito trazer isso para essa escola, que é essa abertura com as outras artes, né?

Como as outras artes podem entrar no circo. O Brasil tem uma força muito grande, agora os espetáculos que eu vi no Brasil é uma força É uma garra, né, uma coisa que está no Global South, está nos países, nos países onde, no sul, nos países mais pobres, diria. Nos países, eles têm uma adaptabilidade

e uma compaixão e uma empatia que o Hemisfério Norte deveria aprender com a gente, eu acho. Mas tem uma coisa que eu aprendi com o mestre chinês, São Francisco, que eu tenho certeza que o fundador dessa escola aqui também endorça, que é, a frase é, training is bitter. Que o treinamento é amargo, não

sei se seria a melhor tradução em português, mas é mesmo assim, o circense tem que estar pronto pra dor. E pro esforço físico. A força do circo, pra mim, é aquela coisa que você acha que a pessoa pode morrer na sua frente, né? Eu acho que essa é a grande força do circo. Você vai assistir espetáculo

e o que tá sendo apresentado pra você é uma coisa quase de super-herói, né?

Luciana

Uma coisa de... Sobre-humana.

Juliana Neves

Sobre-humana, mas que desafia a morte, né? E não tem como a gente chegar nessa... Que o atleta de alto nível também tem, né? Quando você assiste uma Olimpíada e tal. A gente tá muito próximo... Por isso que eu acho que é muito especial. Porque a gente tá muito próximo do atleta de alto nível Mas

também tem que ser artista, né? É uma arte muito completa, eu acho.

Luciana

E que conselho você daria aos jovens, às pessoas de todas as idades que sonham com uma carreira no circo hoje? Principalmente nós, imigrantes na Austrália, né?

Juliana Neves

Tudo é possível. Eu acho que a gente tem que ter essa força de que quando você quer uma coisa, ela pode acontecer. Eu sou exemplo disso. Eu entrei no Cirque du Soleil, eu tinha 27 anos, já. Sabe? Todo mundo diz, nossa, eu entrei no circo, eu tinha 21, né? Eu quis ser bailarina e fiz ginástica

olímpica. O circo apareceu meio por azar. Mas eu acho que é confiar no seu sonho. Se for no circo, trabalhar, treinar muito. Fazer o seu truque mil vezes. Sem errar. conselho chinês também esse. Eu acho que se mudar para outro país... Eu tinha dito para mim que eu não ia mais fazer isso quando eu

estava nos Estados Unidos. Que eu já não ia mais para país novo e aqui estou eu. Então acho que a vida sempre surpreende a gente. E eu acho que quando você muda de país é uma é uma oportunidade para você se representar para o mundo, né? Para você se reavaliar e se representar para o mundo. É começo

novo. Então eu acho que é.

Luciana

E com quantos anos você está agora, Ju?

Juliana Neves

Eu tenho 54 anos, vou fazer 55 ano que vem.

Luciana

Então eu vou fazer ping pong com você, eu faço uma pergunta e você responde da maneira como você achar melhor. Descreva o circo em três palavras.

Juliana Neves

Treino, insistência, magia.

Luciana

Qual é o maior mito sobre o circo que você gostaria de quebrar?

Juliana Neves

Ah, que é uma bagunça. Eu odeio quando as pessoas usam o circo This is a circus, como sendo uma bagunça. Nos Estados Unidos, eu recebo e-mail que fala The National Circus, a bagunça da política. Não, esse é mito errado, não é uma bagunça.

Luciana

O que o circo te ensinou sobre a vida?

Juliana Neves

Que ser nômade é a melhor coisa do mundo.

Luciana

Qual o lugar mais inspirador onde você já se apresentou?

Juliana Neves

O palco da Ópera de Paris. o teto do Chagal.

Luciana

Uma palavra brasileira que todos deveriam conhecer.

Juliana Neves

Eu acho que saudade ainda é a grande palavra pra mim.

Luciana

Qual que é o seu número de circo, o seu truque de circo favorito de assistir?

Juliana Neves

Trapézio de voos. Sabe qual é, né? O trapézio que tem uma rede embaixo.

Luciana

Que eles ficam voando lá em cima, né?

Juliana Neves

É, eles passam, eles voam e são pegos por uma pessoa do outro lado. É número que Ele voa e ele faz o truque e o portô pega ele do outro lado, leva ele e ele volta pra barra e volta pra banquilha.

Luciana

E você é uma bailarina, dançarina e artista circense, então qual que é o número de circo favorito de apresentar pra você apresentar? O que que você mais gosta de apresentar? Ou gostava, né, quando você tava ali no palco?

Juliana Neves

É o número que eu fazia, que é uma especialidade que eu criei com o meu professor, que chama É o número de tecido em voos, né? É tecido voando, entendeu? Então, é o tecido, mas você tem motor que faz você voar. Então, até hoje eu sonho com essa sensação de voar, porque é uma coisa muito gostosa. De

estar no ar, mas apenas pelas suas próprias mãos, né? Presa num tecido. É bem arriscado, mas esse foi o número que eu fiz mais tempo. É o que tá, como falo, tatuado no meu corpo, né? Eu poderia, mesmo fora de forma, eu poderia fazê-lo amanhã, vamos dizer assim, sabe? Tá dentro de mim. É seda, né? Na

verdade o nome é silks, inglês. A gente chama de tecido no Brasil. Uma curiosidade é que o tecido brasileiro é o melhor do mundo.

Luciana

Olha!

Juliana Neves

Inclusive trouxe aqui pra Austrália já e a Austrália inteira quer comprar agora, porque aqui não tem. Chama liganete, que é poliamida que o Brasil faz como ninguém. E eu sempre levo pro mundo inteiro esse tecido.

Luciana

Tá aí uma coisa que os australianos podem aprender com o Brasil, né?

Juliana Neves

Aprender com o circo do Brasil, exatamente. Aliás, já tô Semana que vem já vamos começar a usar os tecidos brasileiros aqui nessa escola.

Luciana

Uma música que sempre te faz dançar?

Juliana Neves

Toda Menina Baiana, do Gilberto Gil.

Luciana

E ou uma artista com quem você gostaria, com quem você sonharia colaborar?

Juliana Neves

Eu gostaria de trabalhar com o Alexander Ekman. Ele é diretor do Ballet de Estocolmo, se eu não me engano.

Luciana

Sim, ele é sueco.

Juliana Neves

Ele é sueco, é.

Luciana

Já fez Swan Lake.

Juliana Neves

Ele faz espetáculos maravilhosos, é.

Luciana

Qual o melhor conselho que você já recebeu?

Juliana Neves

O melhor conselho que eu já recebi é do meu treinador do Cirque du Soleil. Ele chama André Simard. Ele já fez a passagem também, esse ano, inclusive. Ele falava em francês, que é... Se você dizer muito, é como se você não tivesse feito o suficiente. Treinar demais também é quase como se você não

tivesse treinado. É tão ruim quanto você não tivesse treinado, entendeu? Se você comer demais, é tão ruim como se você não tivesse comido nada. Eu acho que serve pra tudo, entendeu? Se você treinar muito, você vai fazer muito esforço com o seu corpo, não vai ajudar você. Tem que saber a hora de

parar.

Luciana

Você tinha algum ritual ou superstição antes de entrar no palco?

Juliana Neves

Boa pergunta também. Eu desenvolvi ritual de formação, né? assim, consciente coletivo católico, porque quando eu entrei no Cirque du Soleil, eu começava, eu era o personagem do ar, né, eram os quatro elementos, e eu era o ar. Eu comecei a... era tão alto, eu entrava a 19 metros de altura, eu rezava

sempre o Pai Nosso, Mãe Maria, batia três vezes na... três vezes na madeira, fazia o nome do pai, fazia...

Luciana

Ah, você usava várias coisas assim, né?

Juliana Neves

Várias coisas, e a rezinha do circo pro Anjo da Guarda, é. Se não fizer isso, antes de entrar em cena, não dá certo, não. Porque é anjo da guarda, doce companhia, me protege de manhã à tarde e da noite, principalmente agora. Ale hope. Isso é uma coisa do circo de São Paulo.

Luciana

A última pergunta, em uma única, em uma palavra, o que o circo significa pra você?

Juliana Neves

Alegria.

Luciana

Então tá, muito bom. E foi essa alegria que você passou aqui na nossa entrevista, realmente acertou.

Juliana Neves

É, obrigada, obrigada.

Luciana

Eu conversei com a Juliana Neves, que está fazendo história aqui na Austrália, se tornando a primeira brasileira a assumir a direção dos estudos circenses do NICA, o Instituto Nacional de Artes Circenses da Austrália, uma instituição renomada, conhecida mundialmente. Muito obrigada, Juliana, pela

sua disponibilidade em ter falado com a gente hoje.

Juliana Neves

Muito obrigada, muito obrigada, Luciana, muito obrigada, viu? E espero que nossos caminhos se cruzem mais aqui pela Austrália.

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