Um ex-militar das Forças Armadas Portuguesas que tinha realizado o sonho de menino ao ingressar e se desenvolver na carreira militar. Depois de seis anos servindo ao seu país, Márcio Carmo decidiu largar a estabilidade de um trabalho que gostava, por uma paixão que surgiu depois: viajar.
Visitar países próximos a Portugal nas férias, folgas, finais de semana e feriados deixou de ser suficiente para Márcio. Ele decidiu explorar o mundo.
Após passar por 49 países, Márcio chegou à Austrália em março de 2022, junto com a companheira Tatiana, e roda o país em uma campervan que ele mesmo equipou. Suas aventuras são compartilhadas no Instagram, onde ele tem mais de 93 mil seguidores.

Entre os 49 países que Márcio visitou antes de vir para a Austrália, está a Jordânia. Esta foto foi tirada em Petra. Source: Supplied
SBS Portuguese: Foi difícil tomar a decisão de largar a carreira militar para viajar pelo mundo?
Márcio Carmo: Não posso dizer que foi fácil, porque as pessoas que me rodeavam, como familiares e amigos mais próximos, me alertaram de que eu deveria ter cuidado, que poderia ser difícil, e que eu tinha um trabalho seguro, estável. Aqueles medos que levam as pessoas a não sair da sua própria zona de conforto.
O que me motivou mais foi realmente ter percebido que eu não queria mais um trabalho em que se trabalha um ano para ter um mês de férias.
Cada vez mais ciente de que a vida passa num instante, resolvi mudar de horizontes.Márcio Carmo
SBS Portuguese: Você fez sua primeira viagem numa campervan em 2015, no sul da Espanha. O que essa viagem te despertou?
Márcio Carmo: Eu pude ver com os meus próprios olhos e sentir no meu próprio bolso que para viajar e ter uma experiência incrível não é preciso gastar muito dinheiro. Eu fiz uma viagem numa campervan com quatro amigos, nós gastamos muito pouco dinheiro e vamos ter (a viagem) sempre guardada no nosso coração e na nossa cabeça.
Não é preciso muito dinheiro para nos divertirmos e seguirmos os nossos sonhos.Márcio Carmo
SBS Portuguese: Depois que você resolveu deixar o seu trabalho e viver viajando, o seu primeiro destino foi a Austrália? Por que você escolheu vir para cá?
Márcio Carmo: Sim. O meu contrato acabou em fevereiro de 2022 e eu vim para a Austrália em março de 2022. Para além de a Austrália ser um dos mais fascinantes países do mundo, talvez por ser tão longe ou por ter tanta diversidade de paisagens e animais, como percebemos que já estávamos a ficar um pouco velhos para aproveitar o programa do governo australiano em qual a gente está (Working Holiday visa), decidimos vir para cá.

Márcio Carmo largou o emprego estável em Portugal para viajar pelo mundo numa campervan. A Austrália foi o primeiro destino escolhido após o pedido de demissão mas é o 50° país que ele visita. Source: Supplied
Márcio Carmo: Sim, até porque a Austrália é um país caro para quem não trabalha aqui e tem que trazer dinheiro de fora. E essa é também uma boa forma de visitar bem o país e poder fazer algum dinheiro. Já renovamos o visto uma vez e pretendemos renovar de novo. Estamos agora em Nova Gales do Sul para fazer os seis meses de trabalho necessário em áreas remotas para a segunda renovação, mas não posso falar exatamente onde estou porque eu ainda não divulguei nas minhas redes sociais para os meus seguidores (risos).
SBS Portuguese: Por falar em seguidores, qual é para você a importância de ter um grande número de seguidores no Instagram? Por lá (@emeciii) você compartilha muito da sua experiência de viagem com fotos e vídeos.
Márcio Carmo: Muita gente me pergunta como é que eu comecei esta história no Instagram, como é que eu consegui muitos seguidores e como é que eu consegui tudo aquilo que já obtive através do Instagram.
Começou como uma página pessoal e continua a ser uma página pessoal. Para além de utilizá-la bastante como também uma ferramenta de trabalho, o Instagram é onde eu inspiro e incentivo muita gente a fazer o mesmo que eu, ou a fazer melhor que eu, ou fazer algo diferente da sua rotina. Hoje em dia o Instagram também me serve como alguma rentabilidade a nível de trabalho.
O Instagram é onde eu inspiro e incentivo muita gente a fazer o mesmo que eu, ou fazer algo diferente da sua rotina.Márcio Carmo
SBS Portuguese: Você já explorou bastante da costa australiana e dos parques nacionais, e já passou por quase todos os estados e territórios do país (exceto Austrália Ocidental, WA). É possível dizer quais foram os lugares que mais gostou?
Márcio Carmo: Difícil responder essa pergunta, mas sem dúvida de que o top dos tops é Queensland (norte de Queensland) e também a Tasmânia. Passamos um mês na Tasmânia e tivemos muita sorte pois tivemos muito bom tempo. Eu saí de lá bronzeado, coisa que não esperava do estado mais frio do país. Em Queensland passamos cerca de seis, sete meses, alguns deles a trabalhar, mas muitos deles também a viajar. Nós fizemos um road trip de quase dois meses por toda a costa de Queensland, as ilhas, foi muito bom.
SBS Portuguese: Quais foram as maiores aventuras que você viveu na Austrália?
Márcio Carmo: Sou muito amante da natureza, montanhas, caminhadas, portanto, para mim, essas são sempre as melhores aventuras. Fiz um trilho numa ilha com crocodilos no norte de Queensland, chamada Hinchinbrook Island.
Foram quatro dias com mochila nas costas, a acampar pela ilha. Isso foi uma parceria que fiz com uma empresa local que portanto, leva as pessoas até a ilha e fornece tudo aquilo que é preciso, que é só preciso um mapa para não te perder.
O trilho está bem assinalado e eu fui com a Tatiana. Fomos os dois sozinhos. Aliás, nós fomos com mais três outras pessoas que também iam fazer o trilho, mas cada um vai ao seu passo, então nos encontrávamos ao final do dia no campismo, na área definida para acampar.
Levamos conosco barraca para acampar e comida para quatro dias. Água nós não precisamos levar porque havia sempre cachoeiras ou cascatas ao redor.

Foto tirada em Hinchinbrook Island, no norte de Queensland, onde Márcio diz ter vivido uma das maiores aventura desde que chegou na Austrália, ao fazer um trilho de quatro dias. Source: Supplied
Nesse eu fui sozinho e combinei com a Tatiana e a Ana, uma amiga brasileira que estava com a gente na Tasmânia, para me buscarem após sete dias, tempo previsto para fazer o trilho, pois estávamos numa zona de montanhas, completamente sem sinal para comunicação.
Elas pois ficaram com a carrinha e eu fiquei no trilho com a mochila nas costas, com cama e comida por sete dias. Mas eu acabei o trilho em cinco dias, e elas só iriam me buscar dois dias depois. Foi muito divertido porque eu cheguei lá e tive que apanhar boleia de algum desconhecido.
Eu ando muito à boleia também sempre que quero ir passear ou viajar para algum lado. Então apanhei a boleia com um israelita e um canadense que também estavam a fazer o trilho, e eles deram boleia até ter sinal e depois liguei para elas e nos encontramos.
Minha maior aventura na Austrália foi na Tasmânia, no Southwest National Park, em um trilho de cinco dias que fiz sozinho.Márcio Carmo
SBS Portuguese: Você vive e viaja pela Austrália em uma van que você mesmo equipou para se tornar sua casa. Qual foi o investimento que você fez para montar essa campervan?
Márcio Carmo: Nós compramos esta carrinha. Era uma carrinha para transportar pessoas com deficiência que usam cadeira de rodas, portanto tinha elevador para cadeiras de rodas, bancos atrás. Nós tivemos que tirar isso tudo e fazer o que fizemos. O investimento foi todo pago com o trabalho na Austrália. Trabalhamos de abril a agosto para pagar esse investimento.
Trabalhamos de abril a agosto aqui (na Austrália) para pagar pela campervan que temos hoje.Márcio Carmo

Márcio comprou e equipou a campervan em que viaja pela Austrália com o salário que ele e a parceira Tatiana receberam por cinco meses de trabalho no país. Source: Supplied
Márcio Carmo: Em comparação com outros países que eu já tinha visitado, a Austrália até agora é dos países mais bem equipados para fazer uma road trip de campervan, porque conseguimos encontrar muitas instalações para a prática do autocaravanismo, como balneários, chuveiros e barbecue, que os australianos adoram, tudo gratuito, tudo outdoor. Os balneários na maior parte tem infraestruturas ao redor super bem organizadas e muitas delas gratuitas. É um país muito fácil para fazer isso.
A Austrália é um dos países mais bem equipados que já visitei para fazer uma road trip de campervan.Márcio Carmo
SBS Portuguese: Por que você prefere viajar por terra?
Márcio Carmo: Aquele estilo de viagem que tu vais de avião, ficas na cidade, apanhas transportes públicos, limita-te muito ao ponto de partida e ao destino final. Limita-te muito a conhecer onde estás e para onde vais. O trajeto no meio tem muita coisa para aproveitar que tu nem sequer vais ver porque estás um bocado limitado. E a road trip é legal por causa disso.
Quem viaja de avião fica limitado ao ponto de partida e ao destino final. O trajeto no meio tem muita coisa para aproveitar.Márcio Carmo

Marcio e Tatiana fizeram de campervan o Explorers Way, trajeto de três mil quilômetros que liga Adelaide/SA a Darwin/NT, e passa pelo deserto na região central da Austrália, onde conheceram Uluru (foto). Source: Supplied
Márcio Carmo: Nos nossos planos nós gostávamos imenso de poder ficar mais tempo na Austrália sem ser este do limite do nosso visto atual. O plano seria ficar aqui mais tempo, porque já percebemos que este é um ótimo país para quem gosta de aproveitar a vida, porque tu podes trabalhar pouco tempo, digamos assim, e usufruir da tua vida muito mais tempo. Então dá-nos essa liberdade para fazer aquilo que nós queremos, que é viajar.
Pode ser que no futuro nós vamos tentar ficar aqui na Austrália para continuar a viajar pelo mundo.Márcio Carmo
SBS Portuguese: O que você recomenda para quem quer ter um estilo de vida como o seu?
Márcio Carmo: Eu recomendo principalmente arriscar, porque o que custa mais é o primeiro passo. "Mas o que é que vai acontecer? E se eu não for capaz?" Se correr mal, vocês tem sempre a vossa casa, no vosso país ou no vosso canto. Podem sempre voltar para lá, por isso não custa nada tentar. Se correr mal, voltam a fazer de novo até correr bem. O primeiro passo é o que custa mais e é aquele que depois torna tudo mais fácil a partir desse. Mas é arriscar, sair da zona de conforto. Isso é o fundamental. Descobrir, porque há muito para descobrir lá fora.
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