Semana Nacional da Reconciliação: Construindo pontes entre o passado e o futuro

ILLUMINATION NATIONAL RECONCILIATION WEEK PARLIAMENT HOUSE

Parlamento em Camberra iluminado com arte de Kayannie Denigan entitulada ‘My Country’. Credit: MICK TSIKAS/AAPIMAGE

A Semana Nacional da Reconciliação de 2025 teve início nessa terça-feira, 27 de maio, e vai até 3 de junho. Nesse período, os australianos têm a oportunidade de conhecer mais sobre as histórias, culturas e conquistas compartilhadas da nação. Este ano, o tema é “Construindo pontes entre o presente e o futuro”.


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Uma celebração da força e da resiliência, com o objetivo de promover a compreensão e o respeito pelos povos Aborígenes e das Ilhas do Estreito de Torres. Todos os anos, de 27 de maio a 3 de junho, os australianos têm a oportunidade de conhecer mais sobre as histórias, culturas e conquistas compartilhadas da nação.

As datas marcam dois fatos importantes na trajetória da reconciliação e na história do país, como explica John Paul Janke, editor nacional de Assuntos Indígenas da NITV e apresentador do principal programa do canal, The Point.

"Uma delas é, claro, o referendo bem-sucedido de 1967, que pela primeira vez permitiu a inclusão dos povos aborígenes nos censos nacionais. A outra é a decisão do caso Mabo pela Alta Corte, em 3 de junho, que pôs fim à ficção jurídica da Terra Nullius, a ideia de que, quando os britânicos chegaram, esta terra não pertencia a ninguém. Essas duas datas são marcos fundamentais da Semana da Reconciliação, e eu incentivo todas as pessoas que conheço a aprender mais sobre o significado desses momentos históricos".

A Semana Nacional da Reconciliação teve início em 1993 como a Semana de Oração pela Reconciliação, que também foi o Ano Internacional dos Povos Indígenas do Mundo. Essa iniciativa contou com o apoio das principais comunidades religiosas da Austrália.

Em 1996, o Conselho para a Reconciliação Aborígene lançou a primeira Semana Nacional da Reconciliação da Austrália. Em 2001, foi criada a Reconciliation Australia, com a missão de continuar a exercer a liderança nacional na promoção da reconciliação.

No mesmo ano, cerca de 300 mil pessoas atravessaram a Harbour Bridge, em Sydney, como parte da Semana Nacional da Reconciliação — e, posteriormente, outras pontes em cidades e municípios — para demonstrar seu apoio à reconciliação.

Hoje, a Semana Nacional da Reconciliação é celebrada em locais de trabalho, escolas, serviços de educação infantil, organizações comunitárias e por indivíduos em todo o país.

A professora Jackie Huggins é uma renomada historiadora, acadêmica e integrante dos povos Bidjara e Birri Gubba, vinculada à Universidade de Queensland. Sua mãe, Auntie Rita Huggins, foi uma importante ativista na campanha do referendo de 1967, que contou com um apoio esmagador de mais de 90% da população australiana para incluir os povos Aborígenes e das Ilhas do Estreito de Torres no censo nacional.

"A Semana Nacional da Reconciliação é sempre uma ocasião para nos sentirmos realmente entusiasmados, mas, ao mesmo tempo, sabemos que ainda há um longo caminho a percorrer. Embora vejamos muitas coisas positivas acontecendo em nossas comunidades, ainda enfrentamos muitos desafios e precisamos estar vigilantes para lutar por justiça para o nosso povo".

Jackie Huggins afirma que os avanços para reduzir as desigualdades ainda são insignificantes e que esse processo está levando um tempo muito, muito longo: "Levará centenas de anos para alcançar qualquer tipo de paridade com os australianos não indígenas em todos esses aspectos. Aqui em Queensland, os programas de tratado e de relato da verdade que implementamos foram ignorados pelos governos".

Mas ela afirma que os povos das Primeiras Nações continuam garantindo a continuidade de seus programas de justiça, há muito atrasados e duramente conquistados.

"Não houve redução no número de crianças colocadas sob cuidados, em lares temporários ou outras formas de acolhimento. Isso se reflete também, especialmente, no sistema de justiça criminal e na situação dos nossos jovens encarcerados. Portanto, há desafios contínuos que precisam ser enfrentados: moradia, educação, emprego, entre outras questões que impactam o modo de vida dos povos Aborígenes e das Ilhas do Estreito de Torres".

Ela diz que o tema deste ano, “Construindo pontes entre o presente e o futuro”, é muito significativo, pois marca o 25º aniversário da caminhada pela ponte realizada em toda a Austrália.

"Aqui em Brisbane, cerca de 80 mil pessoas participaram da caminhada, assim como muitas outras que caminharam em suas comunidades locais em apoio à reconciliação. Esse apoio tem sido enorme para nós. Atualmente, temos muitos jovens que ainda carregam uma grande determinação".

Jackie Huggins afirma que eles também desejam ver grandes mudanças acontecerem também em suas próprias vidas.

"Para aqueles de nós que lutam há muito tempo, por décadas. No meu caso, são 45 anos. Queremos passar o bastão e garantir que os jovens assumam a dianteira, tornando-se a próxima geração, porque nós suportamos grandes mudanças por muito tempo. Também conquistamos alguns avanços políticos importantes, mas ainda está longe de ser suficiente para reduzir as desigualdades em nosso país".

Neste ano, o Museu Marítimo Nacional da Austrália celebrará a Semana da Reconciliação 2025 com uma instalação das 12 conchas de tartaruga, pintadas à mão pela artista do Estreito de Torres, Gail Mabo, distribuídas pelo convés do Endeavour.

Em 11 de junho de 1770, o navio do tenente James Cook, o Endeavour, encalhou em um recife de coral no extremo norte de Queensland. O incidente ocorreu em uma área do Mar Territorial pela qual o povo Guugu Yimithirr tem responsabilidade ancestral de cuidado e proteção. O recife também faz parte do Mar Territorial tradicional de vários clãs Aborígenes Yalanji do leste, incluindo Wyamburr, Yuki Baja-Muliku, Kuku Bididji, Kuku Yalanji e Kuku Nyungkul.

Matt Poll é gerente dos Programas Indígenas do museu. "Eles acabaram passando cerca de seis semanas ali, e ocorreram vários tipos de interações. Mas uma das mais significativas, que Cook, Banks e os demais membros do Endeavour mencionam, foi quando algumas pessoas do povo Guugu Yimithirr subiram a bordo do navio. Ao olhar ao redor, ficaram horrorizadas ao ver várias tartarugas de tamanho natural, capturadas em uma época inadequada do ano e retiradas de uma área sagrada de reprodução das tartarugas".

Ele diz que o grupo indígena viu isso como uma grande transgressão. "É literalmente como entrar em um supermercado e sair sem pagar nada. Por isso, eles foram confrontados pela comunidade local por quebrarem a lei, e esse foi o estopim para uma série de eventos que ocorreram quando Cook e seus homens desembarcaram da vez seguinte. O povo Guugu Yimithirr queimou parte do terreno, e Cook disparou contra uma das pessoas locais durante esse incidente".

Como alguém que valoriza as vozes contemporâneas dos povos das Primeiras Nações em coleções e exposições, Matt Poll se diz muito orgulhoso de poder apresentar uma instalação de Gail Mabo, filha do ativista pelos direitos territoriais Eddie Mabo. Ele afirma que o museu oferece excursões virtuais para estudantes que não podem comparecer presencialmente.

"Na segunda-feira, temos nossas excursões virtuais para estudantes escolares. Qualquer aluno de qualquer região do estado pode participar. Você pode encontrar mais informações no nosso site. Estamos preparando uma grande apresentação. Geralmente, recebemos centenas de estudantes, e essa excursão virtual aborda a história da Semana da Reconciliação na Austrália, além de relatos práticos sobre a reconciliação em todo o país".

Também haverá uma projeção no telhado como parte do Festival Vivid. John Paul Janke afirma que a história da Semana Nacional da Reconciliação remonta ao início da década de 1990.

"Por volta de 1991, houve uma Comissão Real sobre mortes de aborígenes sob custódia. Uma das recomendações dessa comissão foi a necessidade de um processo de reconciliação para tratar das desigualdades enfrentadas pelos povos indígenas na Austrália. A partir dessa recomendação, iniciou-se um processo de dez anos voltado para a reconciliação e para reparar a relação entre indígenas e não indígenas do país. Agora, em 2025, essa ideia de reconciliação permanece, com o objetivo de concluir esse trabalho ainda inacabado".

Ele diz que esperavam alcançar a reconciliação até 2001, ano do centenário da Federação na Austrália. "Levou um pouco mais de tempo, mas esse tema continua atual: a busca por uma Austrália unida que respeite esta terra para todos, valorizando também a herança, a história e os povos aborígenes e das Ilhas do Estreito de Torres como parte da nação australiana".

Ele afirma que o tema deste ano se apoia em um aniversário fundamental para o movimento pela reconciliação.

"São 25 anos desde a famosa Caminhada pela Reconciliação na Harbour Bridge de Sydney. O ano 2000 foi um marco desse processo de dez anos iniciado em 1991, que buscava construir um forte movimento popular em prol da reconciliação. Essa caminhada reuniu mais de 250 mil pessoas atravessando a Harbour Bridge de Sydney, destacando que a população dava prioridade à necessidade de reconciliação no país".

Ele acredita que a Semana Nacional da Reconciliação deste ano pretende dar continuidade a esse impulso, resgatando o espírito do movimento popular. "Após o referendo de 2023, o referendo da Voz Indígena no Parlamento, as pessoas estão dizendo que precisamos da reconciliação mais do que nunca e que é preciso, de fato, concluir aquilo que chamamos de “negócios inacabados” deste país".

Jackie Huggins conclama as pessoas não indígenas a se unirem à luta por mudanças. "Mantenham a indignação, eduquem-se e eduquem suas famílias sobre o que nosso povo, como povos das Primeiras Nações, está enfrentando. Sejam aliados fortes e confiantes na luta por verdades e justiça, e nunca percam de vista o objetivo à nossa frente: a verdadeira libertação do nosso povo, assim como a justiça social que precisa ser alcançada em nosso país".

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