Começar uma vida na Austrália é um processo marcado por expectativas, esforço e, muitas vezes, solidão.
Para entender como diferentes setores têm apoiado a saúde e o bem-estar das jovens famílias e mesmo estudantes internacionais que chegam na Austrália, a SBS em Português conversou com Ranielson Santana, presidente da Associação Brasileira da Austrália do Sul (BASA) e membro do Comitê Consultivo das Comunidades Multiculturais do estado; Patrícia Alves de Araújo, coordenadora do Projeto Multicultural no Northern Grampians Shire Council; e Júnior Mello, gerente de projetos na CMS Sport, organização dedicada à inclusão multicultural por meio do esporte.
Uma comunidade jovem que cresce rápido
Ranielson explicou que a comunidade brasileira em South Australia mudou radicalmente em uma década. “Dez anos atrás eram 100 brasileiros. Hoje já somos quase 4 mil”, afirmou.
Esse crescimento acelerado trouxe novos desafios. “A maioria é de recém-chegados, estudantes internacionais. É uma comunidade jovem e isso impacta diretamente as demandas de saúde mental.” Segundo ele, a chegada envolve pressão, mudança de expectativas, adaptação ao visto, choque cultural e ritmo de trabalho diferente. “Tudo isso se acumula e afeta a saúde mental”, disse.
Rede de Apoio: uma resposta comunitária
Para enfrentar esses desafios, a BASA criou o projeto Rede de Apoio. “É um projeto financiado pelo governo, gratuito, com atividades físicas, terapêuticas e foco em conexões sociais”, explicou Ranielson.
Qualquer pessoa pode participar através do site ou redes sociais da associação.
“É exatamente sobre bem-estar, saúde mental e pertencimento.”
Em Grampians, cidade a cerca de três horas de Melbourne, Patrícia Alves coordena um plano multicultural numa região que tem recebido novos imigrantes devido à demanda por mão de obra.
O projeto trabalha com três pilares: celebração cultural, envolvimento da prefeitura local e parcerias com outras organizações.
“O objetivo é tornar a região mais consciente da diversidade e criar espaços onde pessoas de diferentes origens se sintam parte.”
Questionada sobre os fatores de risco à saúde mental do imigrante, Patrícia foi direta: “A falta de conexão social e a discriminação no ambiente de trabalho. Eu mesma sofri bullying,” disse.
Ranielson acrescentou que o idioma, as expectativas irreais e o choque cultural agravam a vulnerabilidade de recém-chegados.
“Muita gente não sente que 'faz parte'. Dizem: ‘Estou na Austrália, mas não me sinto parte desta sociedade’. Essa falta de pertencimento é um risco enorme.”
O papel do esporte na saúde e na integração
Para Júnior Mello, o esporte é uma das ferramentas mais poderosas de inclusão.
“O esporte complementa iniciativas de saúde mental e cria conexão imediata”, disse.
Ele explica que a CMSport trabalha com as principais entidades esportivas do país para torná-las mais inclusivas. “A barreira do medo de ser discriminado afeta até a participação em atividades básicas para o corpo e a mente. Nosso trabalho é ajudar o esporte a abrir espaço, não só para participar, mas também para ser voluntário ou trabalhar na área.”
O que funciona — e o que não funciona
Ao falar sobre estratégias que ajudam na adaptação, Ranielson destacou a força das experiências culturais.
“Comida conecta. Um evento com feijoada, churrasco, isso traz memória e aproxima as pessoas. Atividades simples, como jogar bola ou fazer um passeio à praia, também têm impacto direto no bem-estar, " diz.
Segundo ele, o que não funciona é copiar modelos sem ouvir a comunidade. “Ctrl-C, ctrl-V [copiar e colar] não funciona. Cada estado tem uma dinâmica diferente. É preciso ouvir a comunidade.”
Patrícia contou os resultados positivos do Grampians Multicultural Hub, grupo que criou no interior. “Montamos um festival multicultural que reúne dança, música e comida de várias nacionalidades. Funciona porque celebra quem vive ali.”
Ela acrescenta que voluntariado é uma das formas mais eficazes de criar conexões. “Te ajuda a fazer parte e abre portas para o mercado de trabalho.”
Recomeçar com apoio
O painel terminou com um reconhecimento comum: recomeçar não é fácil, mas conexões fortes podem transformar a experiência. Como disse Ranielson, “pertencimento muda tudo”.
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