Os cinéfilos e também saudosos do Brasil que vivem em Sydney têm uma opção única de divertimento pelos próximos meses. A cidade é o palco daquela que provavelmente é a mais abrangente prospective de cinema brasileiro já feita na Oceania. A série "Brazil! Brazil! A century of cinema!" traz de graça, toda quarta-feira e domingo até 9 de novembro, um filme brasileiro na Art Gallery de Nova Gales do Sul.
A mostra teve início em 17 de setembro e contempla um vasto leque da cinegrafia brasileira de diversos momentos e gêneros, entre clássicos e alternativos.
Alguns filmes já foram apresentados. Entre os que ainda têm sessões marcadas estão:
Terra em Transe, o filme que fez o baiano Glauber Rocha ser reconhecido entre alguns dos maiores cineastas do mundo.

Terra em Transe (1967), de Glauber Rocha. A estética difícil é também um manifesto sobre a situação política do país daquele tempo, defende Stefan Salomon. "Não vamos mostrar as belezas do Brasil, não vamos trabalhar num estúdio. Vamos filmar lá fora, colocar a câmera contra o sol, o ambiente vai parecer desolador, destruído. Dói nossos olhos, o que também é uma bela forma de pensar a violência. Impacta quem assiste".
Os Homens que eu Tive, de Tereza Trauman, censurado pela Ditadura em 1973 e que traz pautas feministas sob pleno regime militar e domínio masculino da produção cultural.
A Rainha Diaba, de Antonio Carlos Fontoura e roteirizado por Plinio Marcos, que traz o ator Milton Gonçalves como Madame Satã em 1974.

Stefan Salomon, sobre o apelo da obra de Zé do Caixão (foto), diretor de filmes populares nos anos 1970 que virou cult internacional entre cinéfilos depois dos 2000: "Há algo sobre o sadismo. A violência é absolutamente horrível e inesperada, sem qualquer remorso. Eu o acho atormentador, ele me aflige."
Também o documentário musical Carmen Miranda - Banana is My Business, de Helena Solberg, que trata da carreira da Pequena Notável, o primeiro grande nome nacional a fazer sucesso em Hollywood.
A Hora da Estrela, de Suzana Amaral, baseado na obra de Clarice Lispector.
O Som Ao Redor, o filme que revelou Kleber Mendonça Filho.
Simplesmente não conhecemos (na Austrália) esta enorme variedade de filmes disponíveis. Há tantos gêneros diferentes nos quais o Brasil tem se destacado historicamente. Especialmente no cinema político, podemos aprender muito sobre o esforço dos cineastas dos anos 60 e 70. E também há um cinema contemporâneo profundo e vibrante.Stefan Salomon, curador da Mostra "Brazil! Brazil! A century of cinema!"
Serras da Desordem, documentário do italiano Andrea Tonacci, que mostra o massacre contra a tribo Awá-Guajá na Amazônia durante os Anos de Chumbo.
O recente O Dia que te Conheci, uma comédia romântica de André Novais Oliveira.
E o Histórias que nosso cinema (não) contava, uma releitura sobre a Ditadura relatada nas pornochanchadas feitas na época.
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Pelos filmes que citamos, alguns clássicos, outros menos conhecidos, é possível perceber que a curadoria da retrospectiva foi feita por gente muito familiarizada com a produção cinematográfica brasileira.
Mas engana-se quem pensa que os curadores vieram do Brasil.
Ruby Arrowsmith-Todd é a curadora de filmes da Galeria de Arte de Nova Gales do Sul.

Ruby Arrowsmith-Todd, curadora das mostras de filmes da Galeria de Arte de Nova Gales do Sul.
Nascido em Adelaide, cresceu em Sydney é um grande conhecedor da cultura brasileira de maneria ampla, não apenas dos filmes.

Stefan Salomon, curador da retrospectiva: "Entendemos ser necessário oferecer uma ampla variedade de gêneros de filmes brasileiros, do cinema mudo ao Cinema Novo, as chanchadas, as pornochanchadas, a produção contemporânea. Filmes que talvez mesmo brasileiros que frequentam cinema não tenham visto". Credit: Red Square Media / Morris McLennan
Além de ter visitado o país algumas vezes, tanto para turismo quanto para pesquisa acadêmica, o professor da Macquarie já publicou, por exemplo, trabalhos sobre o Cinema Marginal, e em breve deve publicar um estudo sobre O Rei da Vela, um filme feito por José Celso Martinez Correa baseado na revolucionária peça do Teatro Oficina.
A violência é algo inevitável nos filmes brasileiros. A violência sexual das pornochanchadas é chocante. 'Pixote' relata a violência contra crianças. O diretor Hector Babenco dizia algo como 'a vida real é ainda mais impressionante que a ficção'.Stefan Salomon.
Conversamos com Stefan Salomon juntamente com o brasileiro Fabio Marques, coordenador do studio Brett Whiteley na Galeria de Arte de Nova Gales do Sul. Apesar da galeria não estar diretamente envolvida na mostra, Fabio, por ser um funcionário da casa e apaixonado pela cultura brasileira, atua junto do curador australiano na promoção e divulgação das obras.

Fabio Marques, coordenador do estúdio Brett Whiteley na Galeria de Arte de Nova Gales do Sul: "Existe um grande 'gap' de relações culturais entre o Brasil e a Austrália, que ainda não teve a percepção das relações que podem existir entre os dois países. Essa temporada na Art Gallery de NSW é um passo".
Se você gosta de cinema, aumente e som e prepare-se para uma deliciosa conversa.
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