Resumo da reportagem:
- Como é a prostituição como profissão para imigrantes na Austrália
- Profissionais do sexo no país tem que escolher entre cumprir leis ou preservar sua segurança
- Os brasileiros Luca, Leilande e Thales falam sobre trabalhar na indústria do sexo na Austrália
Atenção: esteconteúdoéconsideradosensível e contéminformações e depoimentosrelacionados a prostituição, exploração e abuso sexual.
Cada estado australiano possui leis distintas e específicas em relação ao trabalho sexual. A Scarlet Alliance, Associação Australiana de Profissionais do Sexo, atua desde 1989 em defesa da descriminalização da profissão em todo o país.
No podcast A prostituição como profissão: relatos de brasileiros na Austrália, a SBS em Português conversou com três imigrantes brasileiros que contam suas experiências na indústria do sexo pago.
Para conferir a história do Luca, estudante internacional que atuou como profissional do sexo por quatro meses em Melbourne para juntar dinheiro para a renovação do visto dele, clique aqui.
Se quer conhecer a história da Leilande Santos Walker, que começou a se prostituir em São Paulo aos 14 anos e hoje tem jornada dupla de trabalho na Austrália, como cuidadora de idosos e garota de programa, acesse este link.
A terceira e última entrevista é com o Thales, 26, que anuncia seu trabalho em websites locais e viaja por diversas capitais da Austrália oferecendo serviços sexuais.
Chegada na Austrália e procura por trabalho
“Chegando aqui (na Austrália), eu fiz muitas aplicações na área de hotelaria, trabalhei em alguns eventos, mas nunca tive nenhum contrato fixo de emprego, o que acabou me gerando bastante ansiedade”, recordaThales.
O início do trabalho sexual na Austrália
Thales diz que sempre teve muita curiosidade sobre essa profissão, e nunca teve preconceito com relação a esse tipo de trabalho: “Ao meu ver é uma profissão que merece respeito como qualquer outra."
"Eu comecei a usar aplicativos de relacionamentos e surgiram várias propostas de favores sexuais em troca de dinheiro, o que me deixou mais confortável com a possibilidade de fazer disso uma profissão", explica.

Foi através de aplicativos de relacionamento que Thales começou a receber propostas de favores sexuais em troca de dinheiro. Source: Getty / Getty Images
E completa: “fui me acostumando, entendendo os meus limites, até o ponto de me sentir totalmente confortável com a situação. Sou garoto de programa há 6 anos, praticamente desde que cheguei na Austrália.”
Apoio familiar
Segundo Thales, ele revelou a nova profissão aos pais logo no início. “Eu contei para a minha mãe por telefone e a reação dela a princípio não foi das melhores, pois isso vai contra sua crença religiosa."
"Mas ela (mãe) acabou me surpreendendo quando aprendeu a respeitar minha decisão. Atualmente, temos bastante contato e a nossa relação é ótima.”
Com o pai foi diferente. Para ele, Thales diz que só contou quando ele veio visitá-lo na Austrália.
“Para minha surpresa, ele aceitou a minha decisão e a nossa relação acabou ficando ainda mais forte depois disso. Inclusive, enquanto ele estava aqui me visitando, aconteceu de eu ter que sair para atender clientes e ele aceitou tranquilamente", conta Thales.
Meu pai entendeu que esse é meu trabalho e disse sentir orgulho de mim por eu ter conquistado minha independência financeira.Thales
"Meu pai entendeu que esse é o meu trabalho e a minha vida. Ele até disse sentir orgulho de mim por eu ter conquistado a minha independência financeira e por estar feliz.”
Retorno financeiro e rotina de trabalho
Sobre a parte financeira, Thales revela os valores que pratica: “uma sessão comigo custa por volta de A$300 por hora, mas o valor pode ser mais alto dependendo do que o cliente procura ou a duração total de uma sessão.”

Thales diz estar satisfeito com a forma como administra sua carreira. Source: Supplied
Clientes em diversas capitais da Austrália
Sobre seus diversos locais de trabalho, Thales diz: “Eu costumo viajar para Sydney, Melbourne, Adelaide, Perth e Brisbane para oferecer os meus serviços e sempre anuncio em websites locais."
Cada cidade tem uma demanda diferente de clientes e a minha intenção é alcançar um público cada vez maior.Thales
Ele diz que nesses seis anos de trabalho sexual nunca passou por uma situação de perigo, mas que já teve alguns prejuízos.
“Houve clientes que não pagaram pelos meus serviços, transferências bancárias que nunca chegaram na minha conta, endereços errados que me fizeram perder tempo e me prejudicaram financeiramente.”
Perfil dos clientes
Thales conta que atende uma variedade grande de clientes, mas afirma: “Posso dizer que 100% deles são homens, a maioria australianos por volta dos 40 anos ou mais, que estão em um relacionamento com mulheres e acredito que sejam bissexuais."
Sobre o que os clientes buscam quando o contratam, Thales diz que os motivos são variados, assim como as experiências que ele tem.
“Há clientes que pagam pela hora, mas se satisfazem em apenas 15 minutos, o que é ótimo. Outros pagam apenas para me tocar, sem que eu precise fazer nada com eles. Já tive clientes regulares que me pagavam apenas para dormir ao lado deles."
Quando aparecem clientes atraentes, eu também acabo satisfazendo meus desejos sexuais e ainda sou pago por isso.Thales
Cuidados com a saúde e prevenção de IST (infecções sexualmente trasmissíveis)
“Eu busco ter um estilo de vida saudável que inclui uma alimentação natural vegana e exercícios físicos. Eu também faço check-ups médicos regularmente, uso preservativos e tomo PreP, um medicamento que qualquer pessoa com uma vida sexual ativa pode ter acesso ao ir num GP (clínico geral)."
Ele explica: "Para quem não sabe, a PreP é um medicamento que evita o contágio do HIV durante as relações sexuais”.

Thales diz que para preservar a saúde, usa preservativos e toma PreP, um medicamento que evita o contágio do HIV durante as relações sexuais. Source: SBS
“Com a internet, a prostituição foi além das ruas e boates, indo parar nos websites de acompanhantes, ao alcance de um clique. Hoje em dia um programa pode ser marcado online, e toda a divulgação, procura e negociação pode ser feita pelas redes sociais.”
Para Thales, “isso mostra que uma das profissões mais antigas do mundo continua se reinventando e precisamos parar de fingir que ela não existe.”
Ele também ressalta que “ainda existe muita falta de informação sobre o assunto e isso acaba gerando bastante preconceito dentro da sociedade."
"Na minha opinião, esta profissão deve ser regulamentada e descriminalizada no mundo todo, assim esse assunto vai deixar de ser tabu e passaremos a ver isso com mais naturalidade", afirma.
Profissão marginalizada
O advogado e ex-Cônsul Honorário do Brasil em Queensland, Valmor Morais, falou à SBS em português sobre a marginalização do trabalho sexual, principalmente para imigrantes.
“Pessoas que tem visto de turista ou de estudante não vão declarar em algum relatório ou pesquisa que são profissionais do sexo, pois isso pode ir contra elas aos olhos da imigração ou na análise do visto. Assim como muitos residentes australianos ou cidadãos também não declaram devido ao estigma que existe contra essa profissão."
"A indústria do sexo está próxima da criminalidade porque nunca houve proteção legal do estado ou das leis para proteger essa categoria”.
Pesquisas sobre trabalhadores sexuais imigrantes na Austrália são limitadas. Uma pesquisa feita em Sydney sugere que imigrantes constituem uma proporção substancial de trabalhadores na indústria do sexo na Austrália, particularmente da Tailândia, China e Coreia do Sul. Saiba mais detalhes fazendo o download do estudo Migrant Sex Workers in Australia.
Cada estado e território australiano possui uma organização de trabalhadores do sexo onde é possível encontrar informações relevantes e suporte para profissionais da categoria. Clique aqui para ter acesso a este conteúdo disponibilizado pela Scarlet Alliance, Australian Sex Workers Association.
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